A morte decidiu fazer greve,
pois era incompreendida pelos seres humanos.
Da greve nasceu o caos, do caos
a perdição, a desumanização a tresloucada busca pela morte além-fronteiras.
Logo se deu conta a morte (a
morte singular e não a universal) que a sua missão urgia seguir.
Enviados os subscritos violetas,
todos foram entregues aos malogrados padecentes.
Mas alguém teimava em não o
receber, logo se pensou, não queria morrer?
A morte encarregou-se
pessoalmente do violoncelista, mas caiu nas malhas do amor e a partir daquele
dia mais ninguém morreu.
O caos regressou? A perdição,
a tresloucada busca pela morte como pacificação da alma? O descanso eterno? A
morte não se poderia render ao amor … mas fê-lo!
Até a própria morte no seu
salão frio, abandonou a foice, ultrapassou o umbral da porta e revestiu o
esqueleto de uma carcaça de fêmea humana para seduzir, mas acabou seduzida,
perdendo o tino e a razão.
Desde esse dia no país
imaginário a morte deixou de cumprir a sua missão pois a sua razão foi
embriagada pelo coração!
Não se consta (nem conheço) que
haja capítulos subsequentes escritos por Saramago, onde se refira que Deus exorte
a morte (com letra minúscula) à razão, o que seria incompreensível, apesar da
autonomia da morte sem ela não existiria ressurreição, logo não haveria religião!
A morte é uma marca que
nasce já em vida, logo não pode imiscuir-se a sua missão por mais tenebrosa e
aterradora que seja, assim não deveria ter-se apaixonado pelo personagem, mas
ainda assim contra a sua natureza fê-lo e amou-o de corpo e alma,
desconhecendo-se qual o rumo da morte e do amor que partilhou. Todos podem
amar, mas não a morte que de tão fria e aterradora mata só com o seu olhar
fulminante!
Se a morte amou, porque não
amam aqueles seres humanos, frios, calculistas, desprovidos de sentimentos? Serão
eles a encarnação em vida da morte, não do corpo mas do sentimento? Sim porque essa
morte deve ser também ela preocupante ou talvez mais, já que a morte corporal é
já de si uma certeza aquando da gestação.
Acredito veementemente que
esses mortos-vivos para o sentimento mais belo que é o amor, também podem ressuscitá-lo
da profundidade obscura da alma, onde o encerram, guardado por correntes de
aço, praticamente inacessíveis.
A morte mata o amor de
muitos padecentes, mas mais tenebroso é a morte do amor produzida por muitos humanos
morto-vivos, que percorrem os caminhos da sua inócua vida quais fantasmas, sem
sentirem o calor do amor que rejeitaram!
João Salvador – 28/12/2013
In: Visão comentada da obra
as Intermitência da Morte de José
Saramago
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